sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Maré

quando você me mergulha
do alto
das pedras do Arpoador
uma onda
que embala salgada seu corpo
na água
transborda-se mares
no meu.

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sábado, 25 de outubro de 2008

Estridência

Faz barulho em minha mente
gritam loucuras por dentro
― carroça com roda rachada
roçando paralelepípedo

Tem uma inquieta gastura
― no atrito dos olhos no tampo da testa
O tom de uma voz indigesta
que engasga a garganta
feito bala dura.

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quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Suicídio

Madrugada e o Pão de Açúcar
mais negro que o céu
na Baía de Guanabara
e ao redor da água escura, pintada
de brilho amarelo em luz torta
os homens circulam como deuses
farfantes
― diários de Ares na aorta ―
e eu, me atiro do vigésimo oitavo
no vazio da palavra,
morta.

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domingo, 12 de outubro de 2008

Perda

Eu vejo o mundo se acabar
quando em silêncio cansado
seus olhos se abrem à minha frente.

Espelham mágoas que perduram
feito as folhas molhadas
encravadas no marrom da sua íris.

Eu anoiteço --
seus cílios, compridos, pesados,
oscilam, insistentes, feito arados

Lavrando o solo impenetrável
das lembranças vermelhas
do outono que enterrou a nossa vida.

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segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Escrita

no meio de um traço não
faço poesia mais
um desabafo.

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segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Diligências

à claridade dúbia
de um sábado de madrugada
eu lhe fiz confidências,
ele me desvendou.

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quinta-feira, 24 de julho de 2008

Imperfeições

Estou
cansada
de qualquer
coisa que tenha
a ver com cem por
cento de convicção –
Medindo-se a Terra
não é tão redonda
E à noite nem
cheia a lua
é inteira

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terça-feira, 15 de julho de 2008

Arrepio

quando o escândalo do coração
ferve o sangue,
a paixão escorre pela pele
e o arrepio explode – mudo
feito orvalho.

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domingo, 13 de julho de 2008

Imortalidade

em sua memória
que meu corpo habita
a minha existência
finita,
eterna.

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sexta-feira, 11 de julho de 2008

Oração

Ora comigo
sonha de graça
preenche a minha veia
enquanto
a hora passa
inerte eu peco
em ventre alheio
Amor.

Rogo à vida
simplesmente
que apesar de amarga
o corpo aguente
agora
e no crepúsculo da nossa sorte
A dor.

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terça-feira, 8 de julho de 2008

Idiossincrasia*

Onde já se viu

poema – digno
elefante – hiático
besouro – moderno
mato – autocrático
legume – suspeito
fogo – amigo
beijo – roubado
amor – proibido
peito – aéreo
óbvio – ululante
tomate – pelado
piquenique em restaurante
exposição – secreta
crime – delicado
mar – desértico
paixão – sensata
saudade – finita
escova – progressiva
silêncio – onomatopaico
anta – meditabunda
bunda – romântica
mente – quadrântica

– Ai, você!
E sua semântica.

* Com expressões de HM e SB

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sábado, 5 de julho de 2008

Fim

Ora comigo
sonhos infindos
Lindos –
e a nossa dor.

Cremos em nada.
Se as horas somem,
versos restam
De amor.

Rezo em teus olhos
Peco em teus braços –
Mastros
no temporal.

Preces ardentes
prantos latentes.
Bemóis
de um madrigal.

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quinta-feira, 3 de julho de 2008

Abismo

Eu sei o inferno –
que pode
ser um banho quente de espuma
derramando palavras
ásperas
ácidas
astillhas,
erguendo muros de bolhas
no vórtice da minha vista
curvando-me das suas pernas
safando-me de seus desígnios
inundada na pedra insossa
– me interno.

Deságuo no abismo.


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terça-feira, 1 de julho de 2008

Sua mensagem

Sua mensagem me traz ―
um sorriso:
os lábios se espalham no rosto
para os lados,
Para cima.
E a borda da minha boca,
como quando a lua é crescente,
presa em linha invisível
de enfeite
de astros
de órbita infinita
Sustenta-se:
Elevados cantos.
Na abóboda da minha boca,
Sua mensagem ― minha
cantiga.


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quarta-feira, 11 de junho de 2008

Dúvida

Pausar assim em suspense
A vida –
Sem graça quando se espera.
A vida que se desespera
não sabe
se vai, se volta,
a vida
em compasso de guerra.

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Cântico

Véu, como se nuvens
na retina atormentada.
As vozes se amargam feito dores.
Íris tremeluz ao seu luar desconsagrado.
Os olhos se alagam feito pântanos.

Céus, passeiam musas,
no altar, anunciado,
as vulvas se murcham.
feito flores.

Ventre que seduz:
O meu lugar,
atropelado.
Os corpos se azedam como rícino.

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Tarde

Teias de seda no varal
tão finas,
as formas mudam com o vento errático.
Amor que nos vestiu revolve
à sina,
idéias bailam no espaço utópico.

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Distância do tempo

O tempo pesa e não passa.
O tempo me amarra em tentáculos.
Rasga os olhos, arranha os ouvidos
soca o peito e adormece o músculo das pernas.
O tempo revolve os pesares.

Desfaz o ventre lentamente como se tivesse um fio solto.
Retira tripa por tripa e as prende com alfinetes.
Em sua bacia, o tempo
nina o pensamento
feito berço de criança sem pai.

A batida ranhida do tempo traduz em medida:
curta-infinita,
distância que nos separa.

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Marcas (da morte e da vida)

Cada ruga, um diploma
O caçador cada presa
um traço na coronha
O matador um risco no cabo
a cada furo de entranha
Palma da mão
cada linha, leitura de cigana



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